Andei uns meses afastada do mundo da leitura e dos livros. Sem vontade de pegar num livro. Geralmente, quando começava um livro, não descansava enquanto não o acabasse. Ou então, quando não me interessava, lia os primeiros dois capítulos e o último, imaginando o restante, e rapidamente passava ao livro seguinte. Demorei três meses a ler o último livro. Muito grave. Não me apetecia, pura e simplesmente. Cheguei a pensar que tinha perdido o gosto por uma das coisas que mais gostava de fazer. Eu, que tantas vezes roubei horas ao sono, até às tantas da madrugada, porque não conseguia parar. Que se passa?, perguntei muitas vezes. Não tinha paciência, não me apetecia ler. Ao mesmo tempo, continuava a comprar livros e, graças a isso, tenho ali uma bela colecção para ler... porque o bichinho da leitura voltou.
O responsável por este re-início chama-se Ray Kluun, e o seu livro Love Life, de coração aberto, que me fez andar com ele para todo o lado, e aproveitar os muito poucos minutos livres desta semana. O livro não faz, certamente, do autor um candidato ao Nobel da literatura. Está escrito numa linguagem directa, crua, onde o calão aflora frequentemente. Mas prende-nos, desde a primeira página.
"Sou um hedonista com monofobia* grave". É assim que Dan, o protagonista deste romance semiautobiográfico, se descreve logo nas primeiras páginas, sem hesitações nem margem para dúvidas. Uma descrição que pouco teria de chocante e extraordinário não fosse o facto de este livro tratar da batalha da mulher de Dan, Carmen, com um cancro da mama.
Jovens, bem-sucedidos e com uma filha prestes a completar um ano, Dan e Carmen eram um casal feliz a viver uma vida despreocupada antes de o diagnóstico os atingir. Mas, revoltado com a crueza do destino e as limitações que daí para a frente marcarão o seu dia-a-dia, Dan recusa-se a abdicar de tudo e inicia uma vida dupla: durante a semana acompanha a mulher aos tratamentos e aos fins-de-semana entrega-se ao álcool e ao sexo fortuito. Love life – De coração aberto é um relato duro e sem concessões, que não deixará ninguém indiferente, de um homem dividido entre a lealdade à mulher e o desejo de viver a vida ao máximo. Honesto, tocante e polémico, confronta os leitores com a pergunta a que ninguém quer responder: quando a vida dá uma volta de 180 graus, estamos sempre à altura do desafio?
Um livro que aborda temas como os valores pessoais, a luta entre a vida e a sobrevivência, a eutanásia, a infidelidade, o amor, e a luta contra um adversário que tem vantagem desde o início, o cancro. É um livro comovente, realista, chocante, sem se tornar maçador, porque ao mesmo tempo tem passagens hilariantes. Um livro que nos consegue colocar num minuto a rir e, no minuto seguinte revoltados, com um aperto na garganta e uma(s) lágrima(s) nos olhos. Sendo um relato feito no masculino, até conseguimos compreender o que se passa com Dan, que se revela um exemplo de força ao acompanhar Carmen nesta batalha, apesar da sua monofobia.
Numa palavra: Gostei. Sabendo que se trata de uma história semi-autobiográfica, mesmo ignorando quais das passagens estão incluídas no semi, penso que só haveria uma maneira de escrever este livro: de coração aberto.
*Monofobia - medo mórbido de uma vida (sexualmente) monogamica que conduz a uma necessidade compulsiva de praticar a infedilidade.
4 comentários:
Fizeste-me lembrar, um livro que há já algum tempo, “Eminência Parda” de Aldous Huxley, que comecei sete vezes e tive saltar uma série de capítulos... Depois sem saber bem como, senti uma necessidade de o recomeçar e então, foi todo de uma só vez e em uma semana... Há livros assim... Em relação ao “Love Life”, vou tentar encontra-lo.
Bjs
Eu tenho andado assim.. sem vontade para ler...
Chatice! O cerebro já começa a ressentir-se:(
Mário
Eu gostei bastante, por vários motivos. Pelos temas que aborda, por ser uma história contada no masculino, a perspectiva masculina do cancro da mama, como lidam com isso.
Acho que vale a pena.
Bjks
MissC
São fases, penso eu.
Eu lia tudo, mas tudo mesmo que me aparecesse à frente. De repente perdi o interess que, felizmente, voltou!
Bjks
Enviar um comentário